A luta contra o Projeto da Morte na Chapada Do Apodi e as
iniciativas de resistência
Dos gritos de angústia e de sofrimento dos
mais de 6.000 agricultores da Chapada do Apodi, expulsos de suas terras para
dar lugar ao agronegócio, começam a surgir também gritos de resistência e de
organização que enfrentam o grande Projeto da Morte – o Perímetro Irrigado
Santa Cruz do Apodi.
O referido projeto, encampado pelo
Departamento Nacional de Obras Contra a Seca – DNOCS e pela política nacional e
local do Rio Grande do Norte, está sendo o mote de diversas manifestações e
iniciativas de luta por parte da sociedade, tendo em vista que desapropriou
mais de 13 mil hectares, retirando de suas terras cerca de 30 comunidades
inteiras, para viabilizar a vinda de cinco grandes empresas transnacionais de
fruticultura irrigada.
As comunidades da Chapada do Apodi há quase
50 anos, tem passado por um processo de organização de sua cadeia produtiva,
baseada em princípios da agroecologia e da reforma agrária. A estrutura
fundiária que hoje se encontra no município de Apodi é fruto de muitas lutas
dos trabalhadores contra a concentração de terras pelos grandes latifundiários.
O complexo de comunidades e assentamentos rurais que hoje existem em Apodi, mudou
completamente a lógica de produção, rompendo com a lógica do agronegócio e
trazendo alternativas para o campo, seja pela reforma agrária, seja pela
produção agroecológica, seja pela segurança alimentar. Assim, Apodi tem o 3º
maior PIB Agrícola do Estado do Rio Grande do Norte, segundo o IBGE, atingindo
essa marca a partir da produção e da organização das comunidades rurais do
município.
O Projeto da Morte vem para destruir com toda
essa experiência exitosa que se constrói hoje em Apodi, pois desterritorializa
as comunidades e rompe com o vínculo que tantas famílias possuem com a terra. O
projeto vem para reconfigurar a conjuntura agrária da Chapada do Apodi,
retornando ao antigo modelo de latifúndio monocultor que ali existia há 50
anos. Trata-se de uma reforma agrária ao inverso, que desrespeita a cultura e
os modos de viver dos agricultores.
Pelas experiências de outros perímetros
irrigados, como o Perímetro Jaguaribe-Apodi no Estado do Ceará, percebe-se uma
série de violações a direitos humanos, sociais, ambientais e trabalhistas por
parte das grandes empresas que se instalam. O uso intensivo de agrotóxicos, que
contaminam a terra, o ar, e principalmente a água (a exemplo o aquífero Jandaíra,
pertencente aos Estados do CE e RN, que já se encontra contaminado), tem levado
também a danos aos seres humanos, com casos de morte já registrados, seja por
contaminação, seja por câncer.
O Projeto da Morte segue a mesma lógica
produtiva do Perímetro Jaguaribe-Apodi, nos levando a alguns questionamentos:
Qual o custo social da implantação desses
perímetros, senão o desrespeito aos modos de vida e à produção dos agricultores
familiares, ao meio ambiente, ao trabalho, e à exploração desenfreada dos
recursos naturais?
De
qual desenvolvimento estamos falando, senão daquele que expropria e destrói
dezenas de comunidades e a vida de centenas de trabalhadores, que resistem e
buscam proteger sua cultura e sua sobrevivência com dignidade e autonomia?
Por qual desenvolvimento lutamos, senão por
aquele que respeita as famílias e à produção destas, baseadas na agricultura
familiar, agroecológica, livre de agrotóxicos e com fundamento na reforma
agrária? Uma agricultura que valoriza a vida humana e a dignidade em primeiro
lugar. Que tem na organização popular seu maior instrumento de luta e
reivindicação?
Assim, as comunidades rurais, os
trabalhadores e trabalhadoras, de maneira organizada, lutam contra o Projeto da
Morte e contra esse modelo de desenvolvimento e produção desumano e violador.
Muitas já foram as iniciativas de resistência e entre elas, há cerca de 40
dias, a ocupação das terras expropriadas pelo Governo Federal, como meio de
voltar os olhos da sociedade para a problemática em Apodi. O Acampamento Edvan
Pinto, situado na BR 405, já conta com mais de 700 famílias acampadas,
reivindicando reforma agrária e a permanência das comunidades expropriadas pelo
Perímetro Irrigado. Trata-se, atualmente, do maior acampamento rural do Brasil,
sendo fruto de uma articulação entre diversas entidades, movimentos sociais e
trabalhadores que lutam por direitos.
Desta iniciativa nos remetemos à discussão de
direitos humanos, considerando a situação de permanente violação e desrespeito
aos camponeses da região da Chapada do Apodi. A luta desses trabalhadores é
permeada pela legitimidade daqueles que lutam contra a exclusão, que gritam por
direitos. A construção de direitos humanos, para além dos diplomas legais, se
constrói nas ruas e nas lutas diárias dos movimentos populares. Assim,
respaldadas pelos princípios constitucionais, as iniciativas de resistência e
luta são ações essencialmente democráticas, que fluem no sentido de serem
sementes de transformação de uma sociedade mais justa e igualitária, baseada na
organização popular, na autodeterminação das culturas tradicionais e no poder
popular.
Mais do que nunca gritamos: NÃO AO PROJETO DA
MORTE!
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